Momento 1: É interessante, está escrito na embalagem: “perfumado e com florzinhas”. O sujeito acaba de destruir a ordem olfativa matinal, em toda a pirotecnia possível do espetáculo também sonoro a se lambuzar nessa trivialidade cotidiana que a sociedade moderna transforma em fatalidade constrangedora: o ato de defecar.
Momento 2: Momento de limpar-se, e bem. As florzinhas perfumadas farão a massagem de limpezas e um perfume que ali deveria impregnar-se para disfarçar a guerra que ali se fez no fim do mundo, ou melhor, no fim do corpo, seu porco.
Momento flor: Do alto da vida prática e da lógica é mesmo de se indagar: qual, afinal de contas seria a função de florzinhas estampadas, em baixo relevo, no verso de um papel higiênico? Por que escolheram exatamente as flores? Por que as flores são exigidas e representadas em tantos lugares, de diversas naturezas: em funerais, casamentos, inaugurações, recepções, seu valor de decoração, sua beleza enaltecida e inquestionável como presente, de namorados ou não, etc? Aparentemente, o máximo do disparate é que as flores venham a comparecer singelamente no momento em que alguém acaba de defecar e precisa limpar-se. Que diferença fariam as flores estampadas na superfície de um infeliz papel que irá se casar com fezes? Digo infeliz, porque feliz somos nós, que deles fazemos bom e variado uso. Desculpem-me, não quero parecer escatológico, mas é que as flores são tantas coisas. Embora esta constatação nos surpreenda, não seria para tanto. A relação que temos com as flores é tão forte que o fato delas extrapolarem e atingirem lugares remotos e perdidos em nossos costumes e tabus morais geralmente não oferece espanto.
As flores são confortantes e estimulantes, em diversos sentidos. As flores aspiram resumir o símbolo todo da sexualidade e da beleza. Tão femininas, tão cores, cheiros e belas. São podiam ser as flores para amenizar a terrível hostilidade moral de uma cagada e a lambuzeira decorrente. Cagar sempre como um ato transgressivo e o florear como ato confraterno, suavizando também a hostilidade da cópula escancaradamente obscena, explícita, em close de zoom. Sim, as flores para conter a morte e a pornografia, as flores são tão sublimes, as fragrâncias, então, tão suaves... E essas reticências caem tão bem com flores, elas somente nos sugerem. Sugerem o coito, os estridentes e frenéticos gemidos do caule e pétalas eretos - visão vegetalizada dos órgãos sexuais a se abrir despudoramente para o mundo todo, como se dissessem: “Eu estou aqui. Vejam, hipócritas, o quanto me amam! Vejam mortais, o quanto sou, o quanto eu posso. Eu transcendo o sexo e a morte. Eu faço amor com a morte. Eu sou o sexo puro brotando da terra, diante dos seus olhos em transe. Sou uma obscenidade divina...”
E as reticências continuam... As flores não exclamam, seu grito é uma visão do caule e pétalas eretos, desafiando a gravidade, a moral e os bons costumes, sem que nínguem, é claro, perceba a sua bela e majestosa revolução silenciosa. As flores são mentirosas. Mas são mentirosas porque são senhoras de uma verdade muito sutil. A sua sutileza é de poder gritar dentro da alma. Quem já recebeu flores sabe muito bem do que estou falando.
E as mulheres...? Mulheres adoram flores. Uma das formas da natureza mais belamente representadas da sexualidade são as flores, e estão aí, à nossa vista, em qualquer jardim. Contemplar uma flor é ter visões de prazeres que se anunciam. Ver uma flor é também saber inocentemente as formas de um gemido de prazer. As flores são absurdamente femininas. Não decidem nunca, não existe matar ou morrer, as flores são teimosas, devem sutilmente resistir. Os homens desejam flores porque desejam mulheres. As mulheres desejam flores porque desejam eternidade... Mas as flores não gritam. E eu aqui inultilmente tentando gritar por elas, dizer o que são ou seriam. Contudo, falar de flores é também falar de mulheres, e falar de mulheres é também possui-las de alguma forma ou, melhor ainda, se me permitem, ser possuído por elas. As mulheres são possuídas pelas flores dadas pelos homens que são possuídos pelas mulheres que possuem os homens que deram as flores que possuem o sexo e a morte, o meio e o fim, para inventar um outro começo, amanhã, talvez...
E ficam as reticências, para sempre... As flores, elas não morrem...
Momento 2: Momento de limpar-se, e bem. As florzinhas perfumadas farão a massagem de limpezas e um perfume que ali deveria impregnar-se para disfarçar a guerra que ali se fez no fim do mundo, ou melhor, no fim do corpo, seu porco.
Momento flor: Do alto da vida prática e da lógica é mesmo de se indagar: qual, afinal de contas seria a função de florzinhas estampadas, em baixo relevo, no verso de um papel higiênico? Por que escolheram exatamente as flores? Por que as flores são exigidas e representadas em tantos lugares, de diversas naturezas: em funerais, casamentos, inaugurações, recepções, seu valor de decoração, sua beleza enaltecida e inquestionável como presente, de namorados ou não, etc? Aparentemente, o máximo do disparate é que as flores venham a comparecer singelamente no momento em que alguém acaba de defecar e precisa limpar-se. Que diferença fariam as flores estampadas na superfície de um infeliz papel que irá se casar com fezes? Digo infeliz, porque feliz somos nós, que deles fazemos bom e variado uso. Desculpem-me, não quero parecer escatológico, mas é que as flores são tantas coisas. Embora esta constatação nos surpreenda, não seria para tanto. A relação que temos com as flores é tão forte que o fato delas extrapolarem e atingirem lugares remotos e perdidos em nossos costumes e tabus morais geralmente não oferece espanto.
As flores são confortantes e estimulantes, em diversos sentidos. As flores aspiram resumir o símbolo todo da sexualidade e da beleza. Tão femininas, tão cores, cheiros e belas. São podiam ser as flores para amenizar a terrível hostilidade moral de uma cagada e a lambuzeira decorrente. Cagar sempre como um ato transgressivo e o florear como ato confraterno, suavizando também a hostilidade da cópula escancaradamente obscena, explícita, em close de zoom. Sim, as flores para conter a morte e a pornografia, as flores são tão sublimes, as fragrâncias, então, tão suaves... E essas reticências caem tão bem com flores, elas somente nos sugerem. Sugerem o coito, os estridentes e frenéticos gemidos do caule e pétalas eretos - visão vegetalizada dos órgãos sexuais a se abrir despudoramente para o mundo todo, como se dissessem: “Eu estou aqui. Vejam, hipócritas, o quanto me amam! Vejam mortais, o quanto sou, o quanto eu posso. Eu transcendo o sexo e a morte. Eu faço amor com a morte. Eu sou o sexo puro brotando da terra, diante dos seus olhos em transe. Sou uma obscenidade divina...”
E as reticências continuam... As flores não exclamam, seu grito é uma visão do caule e pétalas eretos, desafiando a gravidade, a moral e os bons costumes, sem que nínguem, é claro, perceba a sua bela e majestosa revolução silenciosa. As flores são mentirosas. Mas são mentirosas porque são senhoras de uma verdade muito sutil. A sua sutileza é de poder gritar dentro da alma. Quem já recebeu flores sabe muito bem do que estou falando.
E as mulheres...? Mulheres adoram flores. Uma das formas da natureza mais belamente representadas da sexualidade são as flores, e estão aí, à nossa vista, em qualquer jardim. Contemplar uma flor é ter visões de prazeres que se anunciam. Ver uma flor é também saber inocentemente as formas de um gemido de prazer. As flores são absurdamente femininas. Não decidem nunca, não existe matar ou morrer, as flores são teimosas, devem sutilmente resistir. Os homens desejam flores porque desejam mulheres. As mulheres desejam flores porque desejam eternidade... Mas as flores não gritam. E eu aqui inultilmente tentando gritar por elas, dizer o que são ou seriam. Contudo, falar de flores é também falar de mulheres, e falar de mulheres é também possui-las de alguma forma ou, melhor ainda, se me permitem, ser possuído por elas. As mulheres são possuídas pelas flores dadas pelos homens que são possuídos pelas mulheres que possuem os homens que deram as flores que possuem o sexo e a morte, o meio e o fim, para inventar um outro começo, amanhã, talvez...
E ficam as reticências, para sempre... As flores, elas não morrem...
1 comment:
Sabe, eu já tinha as vezes conjeturado sobre essas propagandas de papel higienico e suas embalagens. Pra algum ser de outra natureza recém chegado a terra, que não tivesse esse dom defecativo comum à humanidade, nunca haveria suspeita de qual seria a utilidade daqueles rolos de papel perfumado.
E outro dia eu sentado no vaso sanitario ( ai é que eu penso ) vi na parede pendurado um pacote de rolos de papel higienico. Nele dizia coisa como "mais macio" e tinha a figura de um meigo, alegre, branco e felpudo filhotinho de cachorro. Intrigado imaginei se a analogia era a de se limpar com um infeliz cachorrinho felpudo. Imaginei o bichinho todo melado, com sua brancura maculada pelo marrom largado no canto.
Me caguei de rir na hora assim como agora.
Frank
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