Monday, January 30, 2012

Timidez e jogo de cena





Há pessoas que são tão tímidas, mas tão tímidas, que quando você olha pra elas, ou percebem que estão sendo observadas, começam a se comportar como se fossem figurantes de novela.

Sunday, January 29, 2012

Dicionário do nonsense poético (várias letras e definições)

Preconceito:



1. a verdade de uma cabeça blindada.
2. salva-vidas da ignorância.



Poesia:
Sombra e água fresca das palavras



Melancolia:
Hino da morte do coração



Tristeza:
Goteira pingando mágoa dentro da cabeça



Sonho (acordado):
Árvore do dia seguinte

Sonho (dormindo):
Tempestade colorida da noite passada



Paixão (boa):
Amanhecer eterno da alma

Paixão (ruim):
Veneno brilhante da ilusão
Buraco negro do amor
Um pilão que mói o coração
Uma estradinha pro inferno, iluminada de dor

Paixão (não correspondida)
Plantação de ódio no coração dos rejeitados




Desespero:
Império do medo.
O exército da paciência depois da explosão de uma bomba atômica dentro do olho.
Apocalipse da razão.


Risada de criança:
O mar da alegria respirando
Quando o sofrimento do mundo todo, em todos os tempos, pára, numa explosão de cores e flores.



Nonsense:
Aquilo que tiro da caixa de ferramentas que tenho na minha cabeça, aberta e prostituída pelo caos desse mundo sem chão que pari há alguns anos atrás.



Masoquismo (existencial):
Pavimentar o chão da vida na forma de dor.

Masoquismo (sexual):
Se masturbar com alicate, chave de fenda e furadeira.



Fome:
Um mundo inteiro a se retorcer e explodir no olhar esbugalhado da vida amputada.

É sempre a parte de fora, a filha do frio.

Dicionário do nonsense poético (letra A: Alma)



Alma (para os céticos):

1. miolo da eternidade engarrafado no narcisismo.
2. luz de pedra no ponto mole da humildade.
3. uma promessa, como tudo nessa vida.


Alma (para os que acreditam nela):

1. oceano da vida interior.
2. célula da eternidade.


Versinho clariciano - Espera de gelo



Espero, como quem cumpre o ritual de uma girafa bêbada, tentando quebrar a barreira do som do que eu poderia ter dito na trilha da vertigem.

Dicionário do nonsense poético (letra P: Pensamento)

Thursday, January 26, 2012

Os horrores de uma UTI: distanásia



UTI pode ser pior do que tortura. Manter vivo, ou ressuscitar repetidamente pacientes terminais e em sofrimento extremo, pode produzir mais sofrimento e dor do que muitos dos piores métodos de tortura já inventados pela humanidade.
Desde que as UTIs foram criadas, na segunda metade do século XX, muitas vidas foram salvas e plenamente recuperadas graças a elas. Por outro lado, a sobrevida, ao alcançar possibilidades indefinidas, pode também gerar muito sofrimento. Pode gerar sofrimentos absurdamente intensos e raramente experimentados antes da criação da terapia intensiva.
Se antes o tempo médio de morte era de cerca de 5 horas, com as UTIs ele se torna muito mais longo e muitas vezes indefinido. Em um ambiente de terapia intensiva é necessário se distinguir pacientes que estão morrendo de pacientes que estão parando. Parada e morte são conceitos distintos, e essa distinção entre uma coisa e outra talvez seja crucial para se distinguir também entre sofrimentos evitáveis e inevitáveis.
Os métodos de tortura medievais costumam ser os mais notórios por sua crueldade e engenhosidade. Na Idade Média, contudo, durante tortura, quando a vítima parava (geralmente por parada cardiorrespiratória), a tortura acabava, pois ocorria a redenção da morte em seu curso natural. Em uma UTI isso não ocorre. Muitos pacientes terminais, em sofrimento contínuo e extremo, param, e quase sempre existe um “cristão” para trazê-lo de volta. As ressuscitações podem ser repetidas indefinidamente, mantendo viva uma pessoa que possui, neste contexto, uma vida absolutamente miserável e marcada pelos sofrimentos mais intensos que podem existir. E isso possui um nome técnico: distanásia.
E a distanásia, o prolongamento indefinido da vida (e muito geralmente contra a sua vontade) e do sofrimento de quem já está condenado a morrer, não é algo incomum. No contexto brasileiro, possui uma incidência maior que a eutanásia e a ortotanásia.
E os argumentos falaciosos a favor da distanásia se resumem a um só: “a vida humana é sagrada”. Ou seja:
1. A vida humana é uma obrigação e não um direito.
2. A vida não é de quem a vive. É do estado, de Deus, menos de quem a vive.
3. Deve ser vivida a qualquer custo.
Contudo, como já argumentei antes, a distanásia produz muito mais custos humanos do que benefícios (se é que produz algum benefício), seja para o próprio sujeito que está morrendo ou para a sociedade:
É mais antiética, antieconômica e antiecológica, pois não elimina sofrimentos evitáveis e é antipática ao sofrimento do outro. O paciente terminal que é mantido vivo, e sofrendo intensamente, ocupa o leito de pessoas que poderiam ser salvas e plenamente recuperadas. Isso tudo implica em perdas humanas e sofrimentos dobrados; em inversão de prioridades; em desrespeito pela vontade de muitas pessoas que optariam por ter seu sofrimento abreviado; e em um custo ambiental também grande, já que uma UTI consome grande quantidade de recursos naturais e energia, produzindo lixo hospitalar (não-reciclável) em excesso.