UTI pode ser pior do que tortura. Manter vivo, ou ressuscitar repetidamente pacientes terminais e em sofrimento extremo, pode produzir mais sofrimento e dor do que muitos dos piores métodos de tortura já inventados pela humanidade.
Desde que as UTIs foram criadas, na segunda metade do século XX, muitas vidas foram salvas e plenamente recuperadas graças a elas. Por outro lado, a sobrevida, ao alcançar possibilidades indefinidas, pode também gerar muito sofrimento. Pode gerar sofrimentos absurdamente intensos e raramente experimentados antes da criação da terapia intensiva.
Se antes o tempo médio de morte era de cerca de 5 horas, com as UTIs ele se torna muito mais longo e muitas vezes indefinido. Em um ambiente de terapia intensiva é necessário se distinguir pacientes que estão morrendo de pacientes que estão parando. Parada e morte são conceitos distintos, e essa distinção entre uma coisa e outra talvez seja crucial para se distinguir também entre sofrimentos evitáveis e inevitáveis.
Os métodos de tortura medievais costumam ser os mais notórios por sua crueldade e engenhosidade. Na Idade Média, contudo, durante tortura, quando a vítima parava (geralmente por parada cardiorrespiratória), a tortura acabava, pois ocorria a redenção da morte em seu curso natural. Em uma UTI isso não ocorre. Muitos pacientes terminais, em sofrimento contínuo e extremo, param, e quase sempre existe um “cristão” para trazê-lo de volta. As ressuscitações podem ser repetidas indefinidamente, mantendo viva uma pessoa que possui, neste contexto, uma vida absolutamente miserável e marcada pelos sofrimentos mais intensos que podem existir. E isso possui um nome técnico: distanásia.
E a distanásia, o prolongamento indefinido da vida (e muito geralmente contra a sua vontade) e do sofrimento de quem já está condenado a morrer, não é algo incomum. No contexto brasileiro, possui uma incidência maior que a eutanásia e a ortotanásia.
E os argumentos falaciosos a favor da distanásia se resumem a um só: “a vida humana é sagrada”. Ou seja:
3. Deve ser vivida a qualquer custo.
Contudo, como já argumentei antes, a distanásia produz muito mais custos humanos do que benefícios (se é que produz algum benefício), seja para o próprio sujeito que está morrendo ou para a sociedade:
É mais antiética, antieconômica e antiecológica, pois não elimina sofrimentos evitáveis e é antipática ao sofrimento do outro. O paciente terminal que é mantido vivo, e sofrendo intensamente, ocupa o leito de pessoas que poderiam ser salvas e plenamente recuperadas. Isso tudo implica em perdas humanas e sofrimentos dobrados; em inversão de prioridades; em desrespeito pela vontade de muitas pessoas que optariam por ter seu sofrimento abreviado; e em um custo ambiental também grande, já que uma UTI consome grande quantidade de recursos naturais e energia, produzindo lixo hospitalar (não-reciclável) em excesso.
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