Saturday, May 31, 2008

Você acredita em destino?

Esta pergunta é comum. E a resposta é simples: sim. Não é questão de acreditar. O destino é um fato inquestionável. Ele existe, assim como o céu, o dia, as árvores e as pessoas. Pois o destino é simplesmente o sentido, a direção para a qual algo está programado. O destino, por exemplo, do ônibus que vai para São Paulo é São Paulo. Ele está destinado para São Paulo, o que por sua vez não quer dizer que chegará infalivelmente .
O destino existe, assim como os acidentes que impedem que ele seja realizado. Destinos são desfeitos por acidentes. Sempre que ocorre um acidente, algum destino está sendo desfeito. Neste sentido, o destino existe e não é imutável.
Porém, quando as pessoas perguntam umas para as outras se elas acreditam em destino, essa pergunta faz uma extensão de sentido do termo. Somente se utiliza a palavra destino, neste caso, por uma questão de costume, de uso comum, seja em que campo for, até mesmo na filosofia. A pergunta mais precisa seria: “Você acredita em predestinação?”. Mas , talvez, ninguém entendesse nada. É compreensível a simplificação.
Penso que o termo predestinação é mais preciso. Fala de um destino fixado previamente, e é um termo cunhado pela teologia. Ou seja, foi criado para afirmar esta idéia.
Neste sentido, acreditar em predestinação é acreditar que alguém escreve o destino. É a idéia de um ser supremo e onipotente a agir sobre suas criações. Determinar irrevogavelmente o futuro de um ser é, de algum modo, agir como seu criador.
Há, por outro lado, quem tenha a concepção de que o destino foi forjado e antecipado à luz de diversos fatores associados. É a própria idéia de predição ou determinação, a qual pode simplesmente ser erguida segundo o misticismo de uma variedade de causas coincidentes ou o controle das mesmas.
Na perspectiva mística deve imperar uma atmosfera nebulosa e mágica, sensacional. Isso foi escrito por entes sobrenaturais, sobre os quais não temos qualquer poder ou acesso. Criaturas da noite ou de luzes transcendentais a produzir um fato único, sublime e preciso, o qual foi planejado nos confins de universos distantes ou paralelos ao nosso, os quais somente não seriam percebidos por míopes de espírito.
Na perspectiva deterministasimplesmente o controle das causas, seu conhecimento preciso e acabado, e assim pode se determinar o que as coisas serão. E isto não demarca nenhum mistério. É simplesmente a explicação racional. Explicar é encontrar as causas. Determinar é saber como manejá-las para se produzir infalivelmente o que se quer. Se, por exemplo, você unir uma chama a um elemento inflamável, terá a combustão deste. Saber como fazer e executar o que se deseja, é determinar. Fogo associado a um elemento inflamável gera uma reação explosiva, de combustão, e não outra coisa. É assim necessariamente. Na filosofia é chamado de necessidade.
Também é muito utilizado o termodeterminante”, o qual, neste sentido, é simplesmente sinônimo de causa. Se um fator é determinante, ele é causa. Finalizando, acreditar em predestinação (em destino, como é comum dizer) é acreditar que tudo está determinado. Para algumas coisas isso é até possível. A morte, por exemplo, é uma predestinação. Todos seres vivos estão predestinados à ela. Porém, o momento e a forma como ela sucederá podem ser inferidos por probabilidades ou por obra do acaso.

Tuesday, May 20, 2008

Aqui se faz e aqui se dá o calote

Aqui se faz e aqui se paga”. E por que seria assim? Onde está escrito que é necessariamente deste modo? Esta concepção julga que há uma justiça divina e infalível, a qual fará com que os maus, ainda nesta vida, neste plano, paguem por tudo o que fizeram de ruim.

O problema é que não faltam evidências contrárias. Ainda mais no Brasil, onde observamos de camarote o desfile da impunidade, no meio político, por exemplo. O que não falta é político corrupto, canalha, terminando seus dias com os louros do sucesso e do amor do povo. Além de não pagar nada do que roubaram, muitos ainda deixam saudades no coração de boa parte de nossa população.

Em relação à corrupção, em nosso país, aqui se fazer e aqui se pagar é exceção. Se a justiça divina está sendo feita, não é nesta vida. Então, modifiquemos, para os que acreditam na justiça divina, fica assim: aqui se faz e no além se paga. Ou: aqui se faz e aqui se dá o calote.

Esse provérbio tenta servir como uma espécie de consolo, muito vago, a depositar em uma providência divina a esperança de futura justiça para os miseráveis que dela foram destituídos. Serve muito bem para quem acredita em retribuições ou compensações transcendentais, sobrenaturais.

uma crença em justiça natural ou divina. O problema é que não existe justiça, nem bondade ou maldade na natureza. Ela simplesmente não carrega conceitos em seu ventre. A natureza simplesmente flui, acontece e pronto. Mais nada. A natureza é muda e sem juízo. Quem julga o que nela acontece somos nós, os seres humanos.

Monday, May 19, 2008

"A voz do povo é a voz de Deus"?

Esse provérbio toma, equivocadamente, a voz do povo por uma verdade inquestionável. E nãomelhor maneira de uma mentira vigorar do que em coro, em grupo, em multidão cega. Minta bem, minta em grupo. Uma mentira, muitas vezes repetida, torna-se verdade. É o que dizia Joseph Goebbels, líder da propaganda nazista alemã. E é também o que sugere Nietzsche, ao dizer que a verdade nada mais é do que a mentira do rebanho.

E a voz do povo faminto por linchamento, por vingança, por pão e circo, por sangue? Do povo que entrega cegamente o poder a ditadores e corruptos? É também a voz de Deus? Não, de forma alguma. Neste sentido, mais cabe dizer que a voz do povo é voz do capeta. dizia Nelson Rodrigues: a unanimidade é burra. E também sugeria Freud, sobre a psicologia das massas, que as multidões não pensam. Agem de modo muito volátil, seguindo simplesmente a trilha do movimento do rebanho. Passam do amor ao ódio em segundos.

Um exemplo notório é das torcidas de futebol. Se o ídolo não está jogando bem, estão babando cólera, e querendo linchá-lo. Se, de repente, ele faz o gol: redenção total. O vilão se transforma em herói em questão de segundos. Ausência completa de sensatez, memória e justiça.

Esse provérbio é conversa de demagogo, de político populista. Dizendo isso, fica muito mais fácil angariar simpatias e votos.

Pela demolição dos provérbios

Provérbios são enunciados rápidos que resumem com força determinadas concepções. Alguns até possuem algumas nuances poéticas ou humorísticas. As pessoas acabam tomando-os como formas inteligentes de dizer ou enfatizar o que pensam. Seus trocadilhos, seus jogos de linguagem, lhes conferem a aparência de fulminantes formas de expressão.

Para o senso comum é um modo bem freqüente para se acabar logo com uma discussão. O provérbio vem como uma bomba no meio de tudo o que estava sendo dito e cala a boca de todo mundo. Isso ocorre porque, de modo geral, expressam enfaticamente uma parte da verdade. O restante fica de fora, e é somente um pensamento mais crítico que pode atingir ou questionar.

Esse ato dos provérbios de calar o pensamento é o que mais me indigna. Funcionam como os nefastos argumentos de autoridade. Chegam, sem muitas evidências, e somente por serem provérbios vão logo impondo o fim da reflexão. Assim, darei início aqui no blog a uma nova sessão: a demolição de provérbios.