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Thursday, May 08, 2014

Maledicência e ódio

Algumas coisas têm me incomodado muito ultimamente. Ódio e fofocas, por exemplo, principalmente em ambientes de trabalho. As pessoas se juntam pra fazer a cabeça umas das outras, contra outras, inventando mil coisas, ou exagerando esse ou aquele traço. Estou muito triste e cansado de conviver com esses conluios, seja onde for, os quais ficam destilando veneno e aumentando conflitos e relações de assédio, marcadas pela perseguição, pelo ódio.

Muitas pessoas, com dificuldades para resolver pessoalmente as diferenças, resolvem cultivar a maledicência. E pior, às vezes onde havia somente uma pequena dificuldade, as distorções se agigantam e desembocam em inimizades, em que um demoniza o outro. Isso tudo produz rupturas com a realidade, com a possibilidade de uma convivência mais rica, dinâmica e harmoniosa.

Há poucos dias, coordenei uma oficina de resolução de conflitos. Trabalhamos comunicação efetiva, linguagem focada em sentimentos, reflexão de sentimentos, saber pedir desculpas (mesmo quando temos a convicção de que estamos certos), evitar a maledicência. A oficina foi divertida e rica, em boa medida. Mas havia uma ou outra pessoa que fazia questão de mostrar que não era do tipo que abria mão de sentir ódio.

Sim, isso existe: pessoas que sentem ódio com muita frequência. Pessoas que têm o ódio como um sentimento central em boa parte de seus comportamentos, como um fator fundamental em sua motivação nesse mundo e nessa vida. Pessoas cuja diversão é destilar veneno e bater em cachorro morto. A vitória do prazer em destruir e massacrar. A vitória do prazer em agredir, em fazer mal.

É sério, conheço pessoas que sentem ódio e se vingam, desproporcionalmente, por besteiras. Arrebentam com outras pessoas por coisas irrisórias. Acumulam poder, do dinheiro, poder político, e mesmo do alto de seu conforto transbordante continuam a se incomodar com qualquer moribundo solitário que tenha lhe esbarrado despropositadamente pelas esquinas da existência.

Thursday, February 24, 2011

A vingança é a melhor forma de perdão?


Em nossa cultura cristã a pressão para o perdão é grande. Não faltam mensagens na internet e no senso comum a estimular tal atitude. Mesmo supondo que devemos perdoar, que isso seja de algum modo benéfico, ainda fica a questão: como perdoar? O que podemos fazer para tornar isso possível. Pois não basta somente ordenarmos: “perdoe e será bom pra você”; “quem perdoa é mais feliz, não fica engolindo veneno”. Não basta ordenar, pedir. O perdão tem, se for o caso, de ser construído. Deve haver condições concretas que o sustentem. E perdão se constrói com compensações.
Uma das formas mais rápidas e eficazes para se perdoar é a vingança. Você se vinga e dois minutos depois já está perdoado. A vingança é um prato que se come frio e com muita pimenta mexicana. Há contudo um problema: a vingança, se produzir a compensação desejada, pode gerar o perdão, mas pode também gerar culpa. É uma forma destrutiva e beligerante na direção do apaziguamento do ódio. Você se vinga, tira o peso do ódio do lombo, talvez perdoe, mas no final são somente os mortos, as ruínas e as cinzas a construir o cenário desse desfecho.
E como construir o perdão de modo mais pacífico? Simples: basta fazer com que o outro se sinta culpado, reconhecendo seu erro, em pedidos explícitos de perdão. E de onde vem esta compensação? De perceber que o outro agora também sofre (de culpa). Sofre como a quem fez outrora sofrer (olha a vingança aí, de novo – será que conseguimos escapar dela?). Um sofrimento um pouco diferente daquele de sua vítima. Mas é muito doloroso também. A culpa pega nosso amor próprio e o esmigalha. Faz com que tenhamos, também, assim como nossa vítima, ódio, ódio de nós mesmos.
Quem não sente culpa, quem não sofre de culpa, quem não está verdadeiramente se odiando, não merece perdão. Ou, por outro lado, quem não reconhece que errou e tenta reparar o erro cometido, com alguma forma de compensação, não merece perdão.
Somos tão capazes de perdoar que só o fazemos quando o fato em questão não é relevante, quando o tempo já consumiu toda a memória, quando o outro repôs exatamente tudo o que se perdeu, ou quando temos a clara percepção de que nosso algoz agora está se odiando profundamente pelo mal que causou a si mesmo devido ao mal que nos fez.

Friday, July 10, 2009

“Perdoa, mas não esquece”?

O senso comum muito se abastece da ideia de que o perdão é valioso e deve sempre ser concedido. Há talvez aí, em nossa cultura, uma influência muito grande dos ensinamentos cristãos. O estímulo ao perdão, independentemente do que tenha ocorrido, é amplamente pregado. E a primeira pergunta é: o que é perdoar, o que isso significa?
Porque há perdões e perdões. O perdão de marido e mulher é com certeza diferente de se perdoar ou “perdoar” (entre aspas) o assassino de um filho, por exemplo. No caso de infidelidade, no casamento, o perdão geralmente significa a reconciliação, o restabelecimento das condições anteriores. Perdoar, nesse caso, é voltar a ser o que era. Amigos, por exemplo, se perdoam, de fato, quando voltam a ser amigos e a exibir a mesma empolgação e vigor da amizade, anteriores ao desentendimento.
Na verdade, a grande questão é que o perdão geralmente não é verdadeiro. As pessoas acabam dizendo que perdoaram mais para satisfazer essa pressão social cristã pelo perdão. Perdoar, de verdade, é permitir que tudo volte a ser o que era, como antes. E isso somente é possível se houver compensações. Exemplo: o sujeito perdeu o livro que lhe foi emprestado e tem seu perdão se comprar outro livro igual, repondo-o, compensando seu erro. Porque tudo nessa vida tem seu preço, inclusive amizade e amor. E amor se paga, muitas vezes, com dedicação e fidelidade. E ele rende o quê? Bem estar, proteção, prazer, alegria, sensação de que nossa vida tem sentido.
Outra coisa que se ouve muito, também: “A gente perdoa, mas não esquece”. E isso é perdão completo, perdão de fato? O perdão não pressupõe o esquecimento? Para perdoar não é necessário esquecer? Por outro lado, é possível compreender o que as pessoas estão querendo dizer com isso: “perdoei, voltei com ele (ainda estão juntos, casados, quer dizer), mas não esqueci, ainda tenho mágoas”. Ou seja, restabeleceu o relacionamento anterior, porém ainda carrega mágoas, o ressentimento sobrevive.
E aí mora geralmente um problema frequente: a pessoa diz que perdoou, mas ainda, como se diz popularmente, “joga na cara”, ou então restabeleceu o relacionamento anterior porque não tinha outras alternativas. Vive uma relação de dependência e abuso com quem ama. Vive a ambivalência de modo muito intenso. Diz que perdoou, mas vive indireta ou inconscientemente agredindo o sujeito “perdoado”. E assim, a pergunta: de que vale dizer, da boca pra fora, que perdoou, para depois restabelecer um relacionamento baseado numa série de confusões e mal entendidos? De que vale bancar o redentor para depois viver o inferno? O inferno de simplesmente não saber o que está fazendo e simplesmente se ver como vítima de seus próprios rancores mal resolvidos? Assim se torna crônica uma relação onde o ódio e as mágoas são sempre mascarados com um série de comportamentos que os tornam ainda mais difíceis de serem resolvidos. Em termos psicanalíticos, diríamos que formações reativas e projeções passam a tomar conta do jogo.
Perdoar ou não perdoar? Eis a questão. Se não for de verdade, perdão completo, se for somente um ato baixado por decreto para apaziguar a moral cristã, não vale a pena. Desse modo ficam abertas as portas para muita coisa mal resolvida, para agressões indiretas, por exemplo, as quais se escondem em atos inconscientes e vão, pouco a pouco, minando com o que restou do amor. E um bom indício de que se perdoou de verdade é o sentimento de compensação. Se nos sentimos compensados, seja lá por que motivo, é possível perdoar. Do contrário, estaremos navegando na mentira.