Não tenho a menor saudade da época em que eu mergulhava em textos obscuros, da tradição mais continental de pensamento europeu, e o quanto muitos desses textos obscuros iriam basear nosso trabalho de psicólogo clínico. Porque eram muitas angústias ao mesmo tempo com, obviamente, toda a questão da inexperiência profissional já embutida nessa conta de sofrimento.
Imagine: em um primeiro momento você tem de lidar com textos nos quais se afoga, sem muitas garantias de que esses autores são alguma referência sólida dentro de uma perspectiva mais acadêmica ou científica.
Primeiro se arrebenta lendo e relendo várias vezes alguma coisa que parece não chegar a lugar algum, que pode muito bem ser obra de charlatanismo travestido de erudição, tendo sido comprado por milhares de acadêmicos mundo e história afora. Depois, em seu estágio, vai para o consultório atender alguém que está com problemas psicológicos sérios. Para posteriormente, muitas vezes, ser massacrado durante um processo de supervisão clínica, no qual seu supervisor puxa sua orelha várias vezes, sobre coisas das quais simplesmente não se entende do que ele está falando. E aí você conversa com outros colegas que acabaram de sair da supervisão, e todos estão se sentindo da mesma forma.
Não, não tenho a menor saudade disso, e fico compadecido quando vejo um estudante de psicologia profundamente angustiado com qualquer coisinha que falou para um paciente durante um atendimento, achando que aquilo irá fazer o mundo desabar. Tenho compaixão dos estudantes que estão presos nesse tipo de processo patológico, que abarca toda uma cultura do modo de atuação clínica em psicologia.
E se você, estudante de psicologia, está se percebendo em um cenário como esses, se puder, fuja para as colinas. Procure mudar seu cenário e supervisor de estágio, ou até mesmo a abordagem com a qual está trabalhando. Você está apaixonado por algumas coisas que são patológicas.
No comments:
Post a Comment