Não existem exames laboratoriais que comprovem a existência da maioria dos transtornos mentais. O diagnóstico é clínico. Ou seja: diz respeito somente à observação que o profissional de saúde, seja ele psiquiatra ou psicólogo, faz.
Trata-se portanto, geralmente, da observação do comportamento do paciente durante as consultas, durante os atendimentos. É assim que geralmente ocorre, pois as visitas domiciliares, para a observação in loco do comportamento dos pacientes, são bem menos frequentes. Outra fonte de informação é também o relato de familiares ou pessoas que convivem com o paciente.
Então o profissional de saúde mental geralmente se fia na forma como o paciente relata seus comportamentos e sintomas, assim como também no relato das pessoas que convivem com ele. Ressalto então que é na forma como o paciente relata seus sintomas e comportamentos, porque não basta somente que relate alguns sintomas e comportamentos. Tudo depende também de como o paciente interage com o profissional que está lhe atendendo.
Portanto, como os profissionais de saúde mental ainda dependem muito de seus recursos semiológicos, clínicos, pois não podem contar com exames que atestem mais indicialmente as peculiaridades fisiológicas em questão, nessa área há uma possibilidade maior de ser enganado por um ou outro paciente.
E não existe somente esse risco. As intervenções dos profissionais de saúde mental têm um impacto muito grande na manutenção ou remissão de alguns quadros, de alguns transtornos. Em alguns casos alguns diagnósticos, ou mesmo algumas licenças e atestados, podem, por exemplo, piorar o quadro.
Os transtornos mentais possuem um tipo de sintoma que é muito peculiar. Não são simplesmente sintomas de tipo ter. São sintomas de tipo ser. Os sintomas psicopatológicos tem uma relação muito íntima com a própria identidade da pessoa.
Essa peculiaridade inclusive pode até fazer soar estranho que alguém diga que tem algum tipo de transtorno. Porque na verdade essa pessoa não simplesmente tem um determinado transtorno. Ela é, em boa medida, aquilo que está configurado segundo os sintomas de seu transtorno.
Não pretendo me estender muito nesse texto, mas talvez sua mensagem central é a de que a área de saúde mental não é nada fácil. Porque ainda é uma área em construção. Ainda carece de diagnósticos mais objetivos, de definições mais objetivas do que realmente está acontecendo com uma pessoa que apresenta determinados comportamentos, ou relata determinados sinais e sintomas, os quais em tese configurariam um transtorno mental.
A história da psiquiatria e da psicopatologia é repleta de erros, de situações nas quais pessoas foram estigmatizadas, encarceradas, excluídas ou discriminadas em função de diagnósticos, os quais não eram justos ou adequados para com a condição que vivenciavam. Essa situação atualmente é menos frequente, mas ainda é mais comum quando comparada a outros contextos referentes à avaliação da saúde e do bem-estar das pessoas.
Portanto, o trabalho em saúde mental demanda muita paciência e tolerância ao fracasso, ao sentimento de impotência, a um sentimento de que ainda temos muito o que criar e desenvolver para que essa ciências tenham uma sustentação científica mais sólida.
Apesar de todas essas dificuldades, o que motiva talvez a maioria dos profissionais nesse campo é, em maior ou menor medida: lidar com a amplitude fascinante da diversidade humana, e os numerosos mistérios envolvidos nisso; e poder exercer uma atividade profissional que compreende o valor das interações amistosas e gratificantes entre as pessoas. Obviamente devem existir outros tipos de motivação. Porém o que me chama mais a atenção são essas duas que citei.
Enfim: é difícil, é muito difícil, mas é também muito fascinante e desafiador!
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