Recebo muitos pedidos de meus
ouvintes do YouTube para fazer um vídeo sobre dicas e sugestões de leitura. Mas
não tenho dicas ou sugestões de leitura pra ninguém, a não ser que alguém me
pergunte sobre uma preferência minha acerca de um assunto específico.
E minhas preferências nem
talvez signifiquem alguma sugestão qualificada de quais seriam as melhores
leituras no tema proposto, pois não conheço tudo o que foi escrito. Gostei de
ler alguns autores, mas não sei se são os melhores em suas áreas.
Também acho um pouco
ultrapassada, ou deslocada, essa ideia de que as pessoas tem que ler x livros
por ano. Um livro é uma maratona danada e e demanda um tempo grande para ser
concluído. Se o autor então começar a incursionar com algum viés ideológico eu
nem recomendo. As pessoas costumam se debruçar, durante tanto tempo e com tanto
esforço, na leitura de um livro, que isso muitas vezes é suficiente para
imaginarmos algumas coisas parecidas com lavagem cerebral, convenhamos.
A depender do autor as ideias
demoram tanto a serem desenvolvidas, e há tanta repetição e redundância, que
não tem como justificar tamanha dedicação a uma única pessoa. Tem que ser
alguma coisa muito agradável de se ler, como uma história bem contada (um
romance, um livro de contos) ou então talvez não valha mesmo a pena,
principalmente se você estiver entendendo pouca coisa do que está escrito, ou
sentir que a leitura não lhe acrescentou muita coisa, ou que o tempo despendido
foi muito grande em função do pouco de conteúdo significativo que você
assimilou.
Somente para lhes fornecer
alguns exemplos, cito-lhes algumas leituras que tive em 1999, quando fazia
mestrado na UnB. Em uma disciplina que traçava relações entre psicanálise e
literatura, li Hamlet e algumas tragédias gregas. Lamento, por mim e por vocês
que estão aqui lendo esse texto, mas essas leituras não acrescentaram quase
nada à minha vida profissional, intelectual ou pessoal. Não aprendi quase nada
de significativo lendo essas obras, e nem mesmo tentando compreender qual era a
importância delas nessas aulas. Podem arremessar suas pedras e me chamar de
burro ou ignorante, mas meus esforços para absorver algum conhecimento dessas
leituras foram muito grandes e praticamente em vão.
Se fosse hoje muito
provavelmente eu teria tirado melhor proveito dessas leituras, pois há mais
facilidade de acesso à informação e assim, mais facilmente, encontramos boas
interpretações ou bons guias para esse tipo de leitura, cujas aulas de meus
qualificados professores do mestrado não foram suficientes para que eu mesmo
compreendesse a profundidade e a relevância dessas obras.
Então a minha percepção
atual, sobre qualquer tipo de leitura, é a de que ela deve ser inserida no
contexto, no horizonte de compreensão e prazer do leitor. Esse engajamento costuma
ser paulatino, e é muitas vezes facilitado pela mediação verbal de alguém mais
experiente, de alguém que já fez essas leituras e pode facilitar a incursão do
leitor nelas.
Outro fator que também julgo
importante se relaciona à função da leitura. Muitas pessoas se dirigem para
algumas leituras com o intuito de produzirem para si mesmas uma espécie de
lustre cultural, o qual poderá ser exibido no circuito esnobe das interações
pseudoeruditas.
E pra quê, depois de uma
série de leituras, se transformar em um caminhão de pólvora, se você pode ser
uma espingarda que atira? O mais importante não são os títulos que você
consumiu, que você leu. O mais importante é no que você transforma aquilo que
assimilou por meio da leitura.
Se boa parte de suas leituras
se transformaram em um exibicionismo descolado da vida vivida, das interações
saudáveis entre você, as pessoas e o mundo, isso tudo na verdade não passou de
desperdício de tempo, o qual poderia ter sido aproveitado certamente com
atividades muito mais prazerosas e saudáveis.
1 comment:
Olá,Adriano. Estou vendo seus vídeos e o blog há dois dias. De modo que não consegui absorver muita coisa ainda, mas estou colhendo muitas discussões interessantes. Aproveito esta postagem para fazer uma pergunta: tenho interesse meramente literário para as questões ligadas à psicologia. Tenho desenvolvido histórias que, de forma inconsciente, e somente posteriormente vim a perceber isso, têm uma forte evocação a transtornos mentais, com personagens obcecados, delirantes, enfim... Como gostaria de realizar mais contos neste sentido, gostaria de ter um conhecimento mais instrumental sobre o assunto. Não tenho interesse acadêmico nem nada do tipo (sou jornalista), mas apenas gostaria de um tipo de leitura que pudesse embasar melhor a criação dos meus personagens, que eu soubesse com mais segurança que tipo de transtornos eles teriam, etc. Pensei até em adquirir algum livro sobre psiquiatria forense, mas não sei se seria o caso. O que você me indicaria? Um livro sobre transtornos mentais que não fosse excessivamente simplório como as informações que encontramos na internet, ams que também não fosse muito hermético e rebuscado para não especialistas... Obrigado! Arilo, Fortaleza.
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