Uma vez postei no
Facebook algumas pérolas do Velho Testamento. Dentre elas há essa aqui:
"O povo de
Samaria será castigado porque se revoltou contra Deus. Os homens morrerão na
guerra, as crianças serão despedaçadas, e as barrigas das mulheres grávidas
serão rasgadas." (Oséias 13:16)
Aí uma pessoa,
conhecida minha, a qual eu prezo, justificou que teria sido necessário Deus
fazer tudo isso, pois se tratavam de tempos difíceis, de guerras e que não
haveria outro modo. Confesso: fiquei perplexo, chocado. Porque essa pessoa tem
capacidade intelectual. Como é que ela me diz que um ser onipotente e
absolutamente bom não tinha outra alternativa a não ser despedaçar crianças e
rasgar as barrigas de mulheres grávidas?
Isso só me faz pensar
o seguinte: adoração e sacralização, de qualquer entidade ou pessoa, são coisas
absolutamente nefastas, pois deixam as pessoas completamente cegas, inclusive
as que têm capacidade intelectual.
Nada nem ninguém é
sagrado, intocável, indiscutível, inquestionável, e nem deve ser. Porque tudo
será permitido para se defender algo sagrado e adorado.
Um dos irmãos
Karamazov dizia que se Deus não existe, tudo é permitido. Michel Onfray defende
o contrário: se Deus existe (e é sagrado e deve ser adorado), tudo é permitido,
até mesmo despedaçar crianças e rasgar as barrigas de mulheres grávidas.
Não vejo problema
algum em se acreditar em Deus. O problema é a perda do bom-senso, da sensatez,
do contato com a realidade e das noções mínimas de ética.
Uma coisa que me
alivia um pouco é imaginar que essa pessoa, a qual eu prezo, muito
provavelmente pensa, eu espero, que esse é um passado que já foi, já era, e que
não voltará mais.
Mas, infelizmente, o
que ela pensa é bem menos sensato, bem menos razoável do que dizer que o Deus
do Velho Testamento é um outro deus, que não é o mesmo Deus do Novo Testamento,
por exemplo.
Por outro lado, eu
compreendo que, devido aos círculos familiares e de amizade aos quais as
pessoas de certo modo estão presas, é muito difícil para alguém de fato assumir
um determinado posicionamento com o risco da reprovação de seus pares, e até
mesmo o risco da perda de amor dessas mesmas pessoas que lhes são as mais
importantes em sua vida.
Conclusão triste e
freudiana: nosso espaço de autonomia e de reflexão ou posicionamento
independentes é quase nulo. Vivemos quase que invariavelmente abafados,
asfixiados, pelo peso dos valores que compõem o tecido social do qual fazemos
parte.
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