Tuesday, January 21, 2020

O hábito de dormir em redes e sua história

Como por esses dias estou viajando de uma cidade para outra, aos poucos, ontem tive de dormir a noite toda em uma rede, coisa que eu nunca havia feito em minha vida. Porque rede pra mim sempre foi somente mais um brinquedo do que algo no qual eu pudesse dormir. Quando criança deitei-me por diversas vezes em redes, mas mais para me esconder e balançar feito louco. Era um balanço no qual eu podia me deitar. Só isso.

E ter dormido durante a noite toda em uma rede foi para mim uma interessante experiência onírica e meditativa. Sonhei constantemente que estava dentro de um casulo ou em uma espécie de útero, e senti que mais meditei do que dormi.

Senti também que em uma rede é talvez possível ficar durante muito mais tempo imóvel, em uma mesma posição, com um número muito menor de consequências desagradáveis do que se eu estivesse em uma cama. Costumo acordar com a coluna um pouco travada, e depois de ter dormido a noite toda na rede parecia que eu não tinha dormido como usualmente durmo em uma cama. Acordei com a coluna zerada.

E de fato em uma rede (que fica disposta em forma de arco e não na horizontal) parece que a pressão sobre o corpo fica muito melhor distribuída. As pernas ficam levemente elevadas, e isso evita problemas de circulação com esses membros. Cabeça e tronco também ficam um pouco verticalizados, e isso diminui a pressão sobre o pescoço, que praticamente não demanda por um travesseiro. Fora o fato de que a elevação de tronco e cabeça não é suficiente para que a pessoa, dormindo, comece a pescar. E tudo isso obviamente deve ter relação com o grau de inclinação e curva que essa rede tem ao ser afixada por suas extremidades. E para quem deseja um pouco mais de horizontalização pode-se adotar aquela postura em diagonal.

Acho interessantíssimo o que uma rede representa. É um objeto muito simples, de baixíssimo custo e fácil de transportar para qualquer lugar, que pode facilmente se transformar em uma cama suspensa, livre de insetos e predadores, em praticamente qualquer lugar do planeta. Até mesmo alpinistas dormem em redes, a centenas de metros de altura, pregados em paredes de grandes rochedos e montanhas. É o dispositivo mais simples já criado para alguém ter uma boa e segura noite de sono. E eu sou uma pessoa fascinada pela simplicidade.

E quanto à sua criação, li o que pude, tentando compreender melhor quando e em que contexto foi inventada. Quando os espanhóis chegaram às Américas perceberam que os indígenas usavam redes para dormir. Então possivelmente as redes vêm sendo usadas por seres humanos, em várias partes do planeta, há dezenas de milhares de anos.

Mas fico com uma pulga na orelha, a pensar que talvez sejam muito mais antigas do que temos de registros atualmente. E o que me faz pensar assim é a história de um outro dispositivo, que é o baby sling, cujo registro mais antigo é de cerca de 500 mil anos. Se um pedaço de tecido, ou algumas tiras de vegetais trançadas, já vêm sendo utilizados há cerca de 500 mil anos, para se carregar um bebê junto ao corpo com maior facilidade, por que as redes que, em tese, são até mais simples, teriam sido criadas tanto tempo depois?

Então creio que, assim como os baby sling, as redes para dormir foram criadas por outras espécies humanas que não nós, os Sapiens, há centenas de milhares de anos.

Então, pensando nisso tudo, e fascinado, ter conseguido dormir pelo menos uma noite em uma rede foi para mim uma experiência extremamente interessante e saborosa. Não sei se conseguirei repetir o intento. Mas fiquei muito feliz com isso, que parece ser muito simples ou bobo para maioria das pessoas.

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