Sunday, October 23, 2016

Leandro Karnal e o vocabulário

No texto de hoje, de Leandro Karnal, ele lamenta um pouco como as pessoas tem se comunicado atualmente, que talvez faça falta um vocabulário mais rico.
Como quase sempre, ele consegue inserir alguns exemplos muito engraçados. Menciona que um vocabulário mais rico talvez ajudasse a resolver alguns conflitos que ocorrem em nosso cotidiano. Se em um desentendimento no trânsito, por exemplo, um motorista xingasse de sacripanta, e o outro não entendesse (ou talvez se identificassse com alguém que prima por um vocabulário mais variado ou exótico), isso talvez funcionasse como um elemento de atenuação da agressividade:
“Visualizem a seguinte cena: numa rusga de tráfego, um motorista grita: sacripanta! um infrator que lhe atravesse a rota. Imaginem se o atingido pela pedrada vocal redarguisse que o insulto é estapafúrdio? Após um sagrado silêncio, talvez, poderiam se entreolhar com certo afeto parnasiano.”
É engraçado, é bonito de se ler, mas vamos traduzir. A sugestão dele é muito boa e acho que vale o esforço em também adotá-la. O que ele propõe para resolver um desentendimento no trânsito, por exemplo, é o que alguns linguistas chamam de contracomunicação. Esta, contudo, também pode ser realizada por meio de refinada ironia ou nonsense. Você pode gritar o início do Hino Nacional, o verso de alguma canção, algum mantra indiano ou coisa parecida.
Karnal também afirma que houve uma perda de nuances na comunicação, a qual se deve em boa medida ao atual cultivo de um vocabulário menos vasto:
“A modernidade asfaltou a estrada vocabular. Nada mais é engastado. Foram assassinadas as nuanças.”
Alegação exagerada, pois essa perda de nuances também pode ser resolvida com o auxílio de adjuntos adnominais, adverbiais, conjunções e mais variados elementos sintáticos de auxílio: "talvez, um pouco, porém, próximo de, em boa medida, na minha compreensão, sinto que, me parece que..."
Resumindo: nosso simpático professor de história da Unicamp propõe uma remediação nostalgista para as imprecisões de expressão e a resolução de alguns conflitos cotidianos, que tem como principais efeitos colaterais o aumento da opacidade e a diminuição da agilidade na relação entre falante e ouvinte.
Não irá resolver, querido professor. Na minha compreensão há formas mais práticas e eficazes para produzir os efeitos que você deseja.

Texto de Karnal:

No comments: