A minha impressão é existe uma certa confusão conceitual no debate sobre a questão do relativismo moral. Penso que existem dois níveis conceituais envolvidos. O primeiro diz respeito aos códigos morais, os quais variam em termos temporais, geográficos, culturais e sociais. O segundo nível diz respeito à questão da existência do bem e do mal. E aí talvez seja necessária a restrição ao que é fundamental. Na minha concepção é fundamental se pensar sobre a essência do mal. Penso que o mal existe sim e, claro, a experiência do mal irá variar de sujeito para sujeito, mas isso não quer dizer que não exista. Varia, mas não deixa de existir. Objetivamente existe. O mal é o sofrimento.
Desde a formulação do paradoxo de Epicuro, séculos antes de Cristo, isso é bem sabido. O mal objetivamente existe porque o sofrimento objetivamente existe. Os seres sencientes sofrem. Os seres humanos sofrem. E boa parte do empreendimento humano visa a construção de dispositivos, estruturas ou realidades para que esse sofrimento seja diminuído. E o bem se refere a toda ação que diminui ou extingue sofrimentos evitáveis, ou toda ação que vise à compreensão de como transformar sofrimentos inevitáveis em evitáveis.
O mal existe, e isso é uma realidade objetiva. Em si o sofrimento é o mal. Analise do modo mais objetivo possível, e observe que, em si, é algo ruim. O sofrimento, em essência, é o mal. Por menor que seja, é um representante do mal, representa o mal. Pode até ser inevitável ou desprezível, mas não faz sentido dizer que é útil. Acho que somente é útil pra quem subjuga o outro por meio dele. Para o opressor é bastante útil. Mas para quem sofre, o sofrimento, em si, é sempre uma carga, um desconforto, e isso já não faz sentido quando já se habituou, quando já se dessensibilizou.
A minha compreensão é a de que não podemos classificar o sofrimento em útil ou inútil, mas de que existem sofrimentos evitáveis e inevitáveis. Se são evitáveis, é um imperativo ético agir para que deixem de existir. Obviamente um dos pontos centrais nessa reflexão diz respeito à distinção entre sofrimentos evitáveis e inevitáveis. E muitos sofrimentos que eram inevitáveis no passado, hoje, com os mais variados desenvolvimentos técnicos e sociais, podem ser evitados. E o que é um sofrimento evitável? É todo sofrimento cuja extinção não tem como consequência a produção de sofrimentos ainda maiores.
Classificar o sofrimento como útil somente facilita a justificação de opressões e atrocidades.
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