Não faz sentido defender que seu método ou sua abordagem psicoterapêutica não trabalha para promover a cura e sim o autoconhecimento.
Pode-se até adotar a psicopatologia estrutural como argumento para a não existência de uma estrutura normal. Então, nesse sentido haveria umas três ou quatro estruturas básicas dos modos de ser e fazer humanos: neurose, psicose e perversão, por exemplo. Há quem defenda que existiria uma quarta estrutura, mas não entrarei aqui nesse detalhe.
Desse modo essas estruturas se manifestariam, por extensão, em tudo o que os seres humanos fazem. A cultura, nas suas mais variadas formas de expressão, se manifestaria tanto de modo neurótico, psicótico, quanto perverso.
Somente para citar alguns exemplos, as religiões teriam uma estrutura predominantemente neurótica obsessiva, enquanto as artes teriam uma estrutura mais neurótica histérica. Sendo que há obviamente manifestações psicóticas nas religiões, assim como nas artes.
Uma das origens dessa concepção é a metáfora do cristal, de Freud. Assim como os cristais, todos teríamos estruturas pré-formadas, que somente aparecem ou se mostram quando o cristal se quebra. Assim nossas estruturas psíquicas somente se manifestariam mais claramente após períodos de intenso estresse, pressão, crise.
Portanto, nesta concepção não existem estruturas doentes e a patologia só se configura com a cisão, a quebra, o rompimento, o comprometimento da integração da psiquê. Pessoas adoecidas estariam na verdade em um momento de crise, quebra, cisão, desmedida. Psicose, neurose e perversão não são patologias. São predisposições do espírito, modos de ser. E isso justifica alegar que existem neuróticos, psicóticos e perversos saudáveis. Porque não existe estrutura doente. Logo, por este prisma específico, não há o que ser curado.
A alegação, porém, de que não se trabalha em função da cura, ou de qualquer tipo de melhoria, se limita somente a este aspecto estrutural. Porque não há como curar as pessoas daquilo que elas são.
Contudo, curar não é somente remover doenças. Não é tão simples assim. Curar, em sentido mais pleno, ideal, parte de princípios etiológicos, que demandam pela compreensão dos fatores causais envolvidos no adoecimento. Desse modo, a cura é a remoção ou a resolução dos fatores causais envolvidos no processo da doença. Uma gripe se cura quando a carga viral causadora da gripe é eliminada e não quando tomamos um paracetamol e nos sentimos temporariamente melhor. Porque não basta se sentir temporariamente melhor (remediar), é importante curar e voltar a viver de modo saudável.
Por outro lado, sabemos que para muitas enfermidades não existe cura completa, mas a melhoria de uma série de aspectos na vida da pessoa. E essas melhorias, se forem sustentáveis, também podem ser vistas como um tipo de cura, mesmo que parcial. Um queijo curado é um queijo melhorado. O termo curar também tem esse sentido, o de melhorar.
A alegação de que não se trabalha em função da cura, de qualquer tipo de cura, e somente em função do autoconhecimento, é frágil. Expõe nossa própria fragilidade de formação técnica, profissional, para ajudar as pessoas a terem uma vida mais saudável. Serve como desculpa para nossa incapacidade para ajudar quem procura por nossos serviços. É somente isso: racionalização do fracasso.
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