Havia uma vizinha que o perturbava, já há muito tempo . Era uma coroa . Hans não tinha nada contra coroas , pelo contrário . Ele mesmo era um . Claro , muito diferente da maioria dos coroas que existem. Porém , também era um deles. E a natureza parece de fato sempre ser aquilo que seleciona vida ou dita o que é estar vivo .
E estar vivo , mesmo sendo um coroa , diz respeito a também gostar de coroas . A vida amadurece e o desejo também . As velhas de hoje , serão as paixões de amanhã , pensava. “Quando eu estiver com meus 60, 70 e poucos anos , apreciarei, com tranquilidade, mulheres na mesma faixa etária . Pois assim é a natureza . E bom que seja assim . Pois senão como ficariam, no campo do amor e da reprodução , o feio , o sujo e o malvado ? Melhor dizendo, tudo o que está fora de padrões socialmente estabelecidos.” O prazer bate todos os dias à nossa porta . E ele nunca deixava de estar atento a isto . Cada gole de cerveja , cada esticada de corpo no frescor de uma manhã sem pressa nem compromisso com nada , era uma oportunidade de gozar o que esta vida tem de bom .
Esta vizinha , moradora de um prédio em frente ao seu , simplesmente não tinha o menor pudor para trocar de roupas ou transitar nua e de janelas completamente abertas : esta fora a primeira impressão de Hans. Contudo , como bom voyeur que era , resolveu começar a observá-la mais detidamente . E pode perceber , depois de uma série de indícios , que a mulher gostava mesmo é de se exibir . Bastava o marido chegar que o show terminava. Ela ia correndo se vestir e não mais aparecia. Quando muito , muito rapidamente e bem distintamente vestida .
Nestas ocasiões em que procedia a implosão de alguns tabus , procurava sempre proceder da forma mais pacífica possível . Assim tudo fluía, soando natural . É impressionante , participara, ainda muito jovem , de algumas peças de teatro marginal em que o nível de exposição pessoal era bem elevado . Já havia transado e se masturbado em cena . Nada disso lhe era novidade . Somente nunca permitiu-se ao registro . Recusara diversas propostas para a realização de filmes pornográficos. As produções teatrais das quais participara tinham pelo menos objetivos artísticos , cênicos . Assim como o cinema de arte que quebra as barreiras do que é pornográfico, sem deixar , por isso , de ser também arte . Mexer com estes limites sempre fora uma constante em tudo o que fazia na vida . E sabia muito bem mexer sem ser hostilizado por isso.
E assim foi, no caso da perversão do pênis marionete em sua janela . Ridículo , obsceno e praticamente livre de qualquer hostilização . Hans caminhava pelo mundo como aquele que sabe viver e vive a própria vida com muita autenticidade e paz . Saboreava o que era extremo sem ofender a quem quer que seja.
Foram se conhecendo, por email. Ele estava solteiro e ela casada . Ficou combinado de que ela lhe telefonaria quando a barra estivesse limpa , assim que o maridão definitivamente estivesse longe de casa . Enquanto isso , ela lhe telefonava algumas vezes na semana e ficavam proseando. Dona Neide era uma senhora simples , de muito pouca instrução . O que tornava tudo ainda mais interessante. Seria uma experiência sexual , íntima , entre duas pessoas radicalmente diferentes . Hans, europeu , falante de várias línguas , viajado , doido , intelectual , drogado e Dona Neide: doida , mãe de família , dona de casa , viciada em telenovelas e crochê e louca pra dar para o primeiro peão que aparecesse, para que assim sua vida tivesse um pouco mais de aventuras .
“Oi , que tal hoje à noite ? O Zé Luís estará de plantão e ficarei completamente sozinha .”
“Ok, que horas ?”
“Depois da novela das sete .”
“Mas acho mais prudente na minha casa .”
“Também acho. Devo então aparecer bem mais cedo por aí . Pode ser ? Digo que vou ao shopping. Que tal ?”
“Ok. A partir das cinco já estarei por aqui , te esperando.”
Telefonou às seis e pouquinho: “To indo”. Bateu à porta e ele abriu. Mais uma vez um susto enorme : feia , muito feia . Um rosto horrendo e muito envelhecido. E com aquela borroqueira toda da maquiagem ficava ainda pior . Estava vestida como uma prostituta de baixo meretrício , o que , ao invés de produzir repúdio , o deixou com um pouco de pena . Era uma coitada de uma senhora , uma dona de casa carente e que um dia fora uma mulher talvez com um rosto bem pouco aprazível , mas com um corpo muito atraente . Fora , possivelmente, a perfeita raimunda: feia de cara e boa de bunda . E as raimundas são sempre , por mais gostosas que sejam, umas coitadas. Os homens só pensam em comer e jogar fora . Elas sabem, e uma desilusão profunda geralmente toma conta de sua existência no momento em que se dão conta disso.
A coisa a que uma raimunda é mais sensível é isso : o fato de poder estar sendo usada, de ser facilmente transformada em coisa . Hans estava atento e resolveu tomar muito cuidado para não tocar nesta ferida . Por outro lado , também queria evitar o outro extremo : que ela se apaixonasse. Sendo assim , não forçou nada , nem mesmo um beijo . Aliás , pelo contrário . Beijo , se pudesse, ele evitaria até a morte .
Deixou-a bem à vontade . Conversaram bastante . Foi como sempre fora na vida . Divertido , leve e autêntico . Sabia deixar uma pessoa à vontade , relaxada e alegre . E não precisou muito para que ela mesma começasse onde tudo começou: em seu exibicionismo . “Ta calor , né... Posso tomar um banho ?”. Sem mistérios , na sua frente , tirou a roupa e foi correndo para o chuveiro . Também despiu-se e entrou junto . Tomaram um banho cheio de risadas e delicadeza .
“Escuta , já vi você nua diversas vezes . Mas quero mais ainda da sua nudez . Quero ir mais fundo . Quero continuar te olhando, exatamente como você gosta . Mas quero que você avance e me mostre o que ainda não mostrou, que radicalize o seu show . Compreendeu?”
Foi até sua bolsa e de lá tirou uns brinquedinhos: um vibrador e algumas bolinhas de pompoarismo. Para seu alívio , parou com a dança desajeitada e deitou-se na cama . Abriu as pernas e começou a mostrar cada camada de seu sexo . De fato , ela ainda tinha boa parte de seu corpo bem preservada. A coloração de sua vulva e lábios vaginais era a mais perfeita possível . Tinham aparência muita saudável e tenra . Beijaria pouco sua boca , mas em compensação o sexo oral seria por conta da casa . Se deu ainda mais conta do quanto uma raimunda é mais facilmente feliz na cama e triste no amor.
Fizeram de tudo , e da forma mais tranqüila possível , como duas pessoas maduras e vividas - não importa a cultura ou o grau de instrução - podem fazer . Ela era linda . Linda em tudo o que foi capaz de construir das ruínas de um mundo que pouco lhe ofereceu de em termos de amor dos homens . E soube também não confundir as coisas . Por nenhum momento teve a ilusão de destruir seu próprio casamento pelo amor a um sujeito que não queria saber de nada como Hans. Neide era muito sensível e inteligente . Logo percebeu que ele estava muito longe de apaixonar-se por ela .
2 comments:
senti uma certa amargura em seu comentario..rs.
mas vc tem razão...
ainda assim, acho que vale a pena, enm q seja pra falar mal.
já fazer como ela e expor algo que nem sei sei se faria realmente...
já são outros miiiil e quinhentos...
eheheheh
beijo, moço sumido
Cara, curti este texto. Me deixou alegrado e relaxado como uma cerveja no fim do dia. Realmente me fez bem. É singelo, louco, nada careta, nada radical e sem intelectualidades inúteis. Muito bom.
Grande abraço,
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