No início da década de 1990, quando fiz minha graduação em psicologia, na USP, eu exibia claramente uma tendência a um quadro maníaco festivo. Em numerosas situações, principalmente em situações literalmente festivas, eu tendia a enlouquecer de uma maneira muito alegre e grandiloquente. Sendo que durante o início de minha adolescência, por volta dos 13 anos de idade, o contexto era completamente diferente e a tendência era muito mais melancólica e desesperadora.
Após 1992 ou 1993, com cerca de 20 anos de idade, eu descobri novos modos de me relacionar com as pessoas à minha volta. Eu tinha, a partir de então, a opção de envolver e confundir muitas das pessoas com as quais interagia. Aprendi a me relacionar de modo a poder também seduzir e divertir. E o estilo que desenvolvi tende muito para o nonsense e a desorganização da expressão como um todo, com o envolvimento com a poesia e as artes tendo tido um papel fundamental para isso.
Lembro-me de várias ocasiões nas quais amigos gratificavam meu comportamento bizarro. Porque era muito divertido. Encontrar comigo, com frequência, era uma espécie de festa louca e sem fim.
Sei muito bem disso e sei quais são os contextos onde esse tipo de comportamento é glorificado e onde causa pânico moral. Eu, contudo, fui tão intensamente gratificado por me comportar dessa maneira, durante meu período universitário e até mesmo depois, durante muitos anos, como já relatei, principalmente em contextos festivos, que foi um pouco doloroso ter de abandonar toda aquela loucura para me adaptar a outros contextos, muito mais sisudos.
Então os anos foram se passando e de repente me vi em situações e grupos com os quais eu deveria somente compartilhar meu lado mais contido e sereno.
E hoje até comentei com dois estagiários:
- Eu sei bem qual é minha maior tendência de enlouquecimento. Sei bem o que me enfeitiça para me arrastar para o abismo da loucura...
Estávamos debatendo um dos casos que havíamos atendido. Trata-se de um paciente grandiloquente e fantasticamente louco, quando em crise. Ele fica em crise maníaca durante 3 ou 4 meses e volta naturalmente, sem a necessidade de medicamentos ou qualquer tipo de intervenção. E tem sido assim durante anos. Obviamente que de uns tempos para cá há uma intervenção psiquiátrica e medicamentosa. Mas essa intervenção, em um primeiro momento, ainda não funcionou.
Eu o atendi somente duas vezes. No primeiro dia senti-me completamente contagiado por sua energia, empolgação e sua loucura maníaca, que também percebi como festiva. Seu comportamento não se desorganizou de modo muito perigoso. Não fica agressivo. Não provoca as pessoas de um modo muito incisivo e que possa com facilidade despertar a violência alheia.
Mas tenho que confessar. Seu discurso é encantadoramente poético, de modo que poucas pessoas percebem. Porque se trata de uma poesia muito bruta e a ser lapidada. Não é poesia para ser imediatamente impressa no papel. É o espírito necessário para que a poesia aconteça. Ele está há uns três meses em um modo de discurso que é completamente aventureiro.
Está persecutório com muitas pessoas. Mas isso não ocorreu comigo, porque nossa afinidade foi muito grande, desde o início. E seus familiares deixaram claro que ele só quer ser atendido por mim. Mas por ora foram somente dois atendimentos e não agendei o próximo, porque não é assim que está funcionando nosso CAPS. Não posso agendar um paciente somente porque gosto dele. Há muitas pessoas precisando de atendimento e os horários devem ser distribuídos da forma mais igualitária possível.
Mas confesso que minha vontade era abraçá-lo como um grande amigo e saírmos para conquistar esse mundo! Ficaríamos dia e noite pelas ruas, fazendo discursos bizarros, reunindo pessoas e conclamando a humanidade para o ponto culminante das percepções alteradas da vida.