Saturday, September 30, 2023

Podemos curar?

Não faz sentido defender que seu método ou sua abordagem psicoterapêutica não trabalha para promover a cura e sim o autoconhecimento. 

Pode-se até adotar a psicopatologia estrutural como argumento para a não existência de uma estrutura normal. Então, nesse sentido haveria umas três ou quatro estruturas básicas dos modos de ser e fazer humanos: neurose, psicose e perversão, por exemplo. Há quem defenda que existiria uma quarta estrutura, mas não entrarei aqui nesse detalhe.

Desse modo essas estruturas se manifestariam, por extensão, em tudo o que os seres humanos fazem. A cultura, nas suas mais variadas formas de expressão, se manifestaria tanto de modo neurótico, psicótico, quanto perverso. 

Somente para citar alguns exemplos, as religiões teriam uma estrutura predominantemente neurótica obsessiva, enquanto as artes teriam uma estrutura mais neurótica histérica. Sendo que há obviamente manifestações psicóticas nas religiões, assim como nas artes. 

Uma das origens dessa concepção é a metáfora do cristal, de Freud. Assim como os cristais, todos teríamos estruturas pré-formadas, que somente aparecem ou se mostram quando o cristal se quebra. Assim nossas estruturas psíquicas somente se manifestariam mais claramente após períodos de intenso estresse, pressão, crise. 

Portanto, nesta concepção não existem estruturas doentes e a patologia só se configura com a cisão, a quebra, o rompimento, o comprometimento da integração da psiquê. Pessoas adoecidas estariam na verdade em um momento de crise, quebra, cisão, desmedida. Psicose, neurose e perversão não são patologias. São predisposições do espírito, modos de ser. E isso justifica alegar que existem neuróticos, psicóticos e perversos saudáveis. Porque não existe estrutura doente. Logo, por este prisma específico, não há o que ser curado.

A alegação, porém, de que não se trabalha em função da cura, ou de qualquer tipo de melhoria, se limita somente a este aspecto estrutural. Porque não há como curar as pessoas daquilo que elas são.

Contudo, curar não é somente remover doenças. Não é tão simples assim. Curar, em sentido mais pleno, ideal, parte de princípios etiológicos, que demandam pela compreensão dos fatores causais envolvidos no adoecimento. Desse modo, a cura é a remoção ou a resolução dos fatores causais envolvidos no processo da doença. Uma gripe se cura quando a carga viral causadora da gripe é eliminada e não quando tomamos um paracetamol e nos sentimos temporariamente melhor. Porque não basta se sentir temporariamente melhor (remediar), é importante curar e voltar a viver de modo saudável.

Por outro lado, sabemos que para muitas enfermidades não existe cura completa, mas a melhoria de uma série de aspectos na vida da pessoa. E essas melhorias, se forem sustentáveis, também podem ser vistas como um tipo de cura, mesmo que parcial. Um queijo curado é um queijo melhorado. O termo curar também tem esse sentido, o de melhorar.

A alegação de que não se trabalha em função da cura, de qualquer tipo de cura, e somente em função do autoconhecimento, é frágil. Expõe nossa própria fragilidade de formação técnica, profissional, para ajudar as pessoas a terem uma vida mais saudável. Serve como desculpa para nossa incapacidade para ajudar quem procura por nossos serviços. É somente isso: racionalização do fracasso.

Friday, September 22, 2023

Fé? Não, desapego.

Obviamente que não puno, mas também não gratifico expressão de imaturidade. Tento puxar a conversa para outros pontos, mais sólidos, realistas ou práticos. Sei que nem sempre é possível trabalhar diretamente ou rapidamente com a realidade. Mas não deixo de fazer aproximações sucessivas à realidade, por mais dura que seja. Porque uma hora a pessoa terá de saber como as coisas são, sem distorções e sem mentiras. Porque isso faz parte do processo de amadurecimento. Porque é necessário crescer, se fortalecer e amadurecer.

A imensa maioria de meus pacientes é cristã. Em circunstâncias extremas, quando possível, gratifico expressões como “Seja o que Deus quiser; seja feita a vontade de Deus”; mas não gratifico “Para Deus nada é impossível”. 

Na vida há mais probabilidades do que certezas. Viver é geralmente navegar por oceanos de incertezas, e tentar compreender o que é mais ou menos provável. Não trabalho com o que é possível mas improvável. Se é muito improvável, saio fora, desisto e parto pra outra. Procuro não me focar no que não depende de mim. Valorizo muito mais o desapego do que a fé. Penso que é muito mais maduro e sólido, sereno, do que a fé. 

Há também desapego no cristianismo. Expressões como “Seja o que Deus quiser; seja feita a vontade de Deus” deixam isso claro. Reforço o uso e a meditação sobre essas expressões de desapego em meus pacientes. Não para que se acomodem, mas para que compreendam que há coisas mais prováveis e outras menos ou bem pouco prováveis. As primeiras merecem nossa atenção e esforço. As últimas não.

Wednesday, September 20, 2023

Diálogo e TDAH

Já atendi pessoas, estudantes, que diziam ter diagnóstico de TDAH, mas não comprovavam isso ou o processo de diagnóstico havia sido realizado de modo muito rápido ou mal feito. 

Um deles não deixou de mexer em seu celular enquanto falava comigo. 

- É urgente? – perguntei.

- Não.

Mesmo assim, mesmo depois de me responder que não era urgente, em atitude até um pouco desrespeitosa, não desgrudou do celular. Não costumava fazer anotações durante as aulas. Tinha caderno, mas não o usava para isso.

Se você é estudante, e tem problemas de concentração, precisa ter caderno e durante as aulas saber fazer anotações nele. E é caderno mesmo, de preferência aqueles que são divididos em matérias. Porque, comprovadamente, anotações no celular ou no computador, não tem o mesmo nível de eficácia. Fora o risco de, numa aula ou numa simples conversa, ser constantemente sequestrado para os algoritmos da internet. E, claro, precisa guardar o celular enquanto conversa com as pessoas. 

Outro me disse que tinha o diagnóstico de TDAH, que tinha dificuldades para se concentrar, para manter o foco, que se distraia com facilidade. Porém, enquanto conversava com ele, e sempre que eu tinha algo a dizer, eu falava e logo em seguida lhe perguntava sobre o conteúdo do que eu havia dito, se ela havia compreendido, pedindo-lhe para que dissesse a mim o que havia entendido.

Nossa conversa, frente a frente, olho no olho, nosso diálogo, foi avançando. E uma coisa para mim estava clara: em um diálogo, em que ambas as pessoas se alternam de modo equilibrado na fala, e que o tempo de cada um falando ininterruptamente não se estende muito, é bastante difícil que alguém se distraia ou perca o foco.

Eis a importância do diálogo, dessa interação cooperativa e naturalmente motivante entre seres humanos, na qual uma pessoa constantemente estimula a outra, fazendo com que se mantenham conectadas, sintonizadas, sincronizadas, para juntas construírem alguma coisa para si ou para o mundo.

O rapaz do celular não queria, naquele dia, naquele contexto, se conectar, e não houve tempo para que eu investigasse melhor por que se comportava assim. Tinha seus motivos. Todos temos nossos motivos

Porém, para mim, por vezes, uma coisa é certa: tentar se esconder debaixo de algum diagnóstico de transtorno mental costuma não ajudar, e pode até piorar alguns problemas, seja lá quais forem.

Saturday, September 16, 2023

Os transtornos mentais e sua complexidade

Está circulando um meme daqueles que tenta comparar doenças (que as pessoas classificam como físicas) com depressão ou os mais diversos transtornos psicológicos. É novamente a tentativa de se mostrar que a depressão é muito mais séria do que as pessoas imaginam, e que deveria ter as mesmas considerações e cuidados que as "doenças físicas" têm.

Neste meme há um quadrinho onde está escrito "Infecção", e ali existe uma série de ilustrações que denotam cuidados por parte das outras pessoas, desejando melhoras, mandando presentes, flores, etc.

No outro quadrinho está escrito "Depressão" e há somente a palavra "Silêncio". 

O problema é que esse quadro dificilmente será completamente alterado. Dificilmente ocorrerá equivalência das duas coisas. Enquanto não houver tecnologias que possam demonstrar materialmente, laboratorialmente, a existência de uma depressão, esse quadro tenderá a permanecer inalterado.

Fora o fato de que o fenômeno da depressão é muito mais complexo do que o de uma infecção. A depressão também sofre influência das interações com outras pessoas, podendo melhorar ou se agravar em função disso.

O comportamento depressivo pode ser punido e assim se agravar. O deprimido que está constantemente reclamando pode, sem perceber, afastar ainda mais as pessoas, e assim piorar seus sentimentos de solidão e baixa autoestima.

Ouvir atentamente uma pessoa deprimida, que está bastante queixosa, pode fazer com que ela se sinta acolhida em alguns contextos. E em outros pode fazer com que esses comportamentos depressivos aumentem em frequência. 

Algumas pessoas podem fazer o uso do diagnóstico ou do rótulo de depressão para se esquivar de obrigações, responsabilidades ou se proteger de juízos condenatórios. Outras pessoas, em outros contextos, talvez precisem desse rótulo ou diagnóstico para parar, descansar e cuidar um pouco

mais de sua saúde que, diante de tantas ameaças ou atribulações, está realmente prejudicada ou em risco.

Muitos talvez precisem urgentemente dessa equivalência com uma infecção, para que possam ser devidamente cuidados e amados. Outros podem, em função dessa equivalência, se enfraquecer e adoecer ainda mais.

E uma coisa é fato: todos precisamos de reconhecimento, companheirismo, respeito e carinho, e não somente quando estamos doentes. Porque isso nos fortalece como um todo, ajudando a prevenir os mais diversos problemas de saúde, inclusive a depressão.

Não existe sofrimento útil

 Quando alguém chega até mim, dizendo "O que não mata, fortalece", e ainda por cima tentando dar uma de erudito, de que essa teria sido uma alegação de Nietzsche, eu olho para a pessoa e respondo, com tranquilidade:

- Ah, sim, entendi: o que não mata, engorda...

E, claro, não deixo de fazer as minhas considerações, de que há também aquilo que não mata, mas deixa sequelas, irreversíveis.

Quem acredita que a sobrevivência é sempre fortalecedora, não compreende (ou se nega a compreender) o que é uma sobrevivência sequelada e moribunda. 

E há também aqueles que dão continuidade a tais ideias, com a concepção de que todo sofrimento é útil ou fortalecedor. E realmente também não se trata disso. Porque não se trata de ser útil ou inútil. Esse tipo de qualificação não cabe ao sofrimento, que é somente evitável ou inevitável. Sendo que muitos sofrimentos, que outrora eram concebidos como inevitáveis, hoje, após alguns avanços técnicos e tecnológicos, não são mais.

Sentir dor durante a extração de um dente talvez fosse algo inevitável há alguns séculos, mas hoje definitivamente não é inevitável e nem desejável. Para quem me diz que todo sofrimento fortalece, prontamente recomendo que vá ao dentista e faça todos os procedimentos sem anestesia. Porque, em tese então, sairá dali do jeitinho que prega: fortalecido. Se o sofrimento fortalece, não use anestesia. É bem simples.

Esses, que fazem elogio do sofrimento, parecem não ter a menor ideia de que atualmente existem as mais variadas técnicas para produzir fortalecimento com muito menos sofrimento ou sequer sofrimento algum. Negar isso é desconhecer completamente a função das artes, dos jogos, de uma série de atividades lúdicas em grupo e de uma variedade de criações humanas que produzem fortalecimento com envolvimento e diversão. 

E quando não há diversão, há pelo menos respeito pelos limiares de cada pessoa, sabendo-se que é possível se fortalecer por meio de aproximações sucessivas e não simplesmente com cassetadas ou coerções.

E o sofrimento é de fato realmente útil para quem se empodera com o sofrimento alheio. Porque tiranos, psicopatas e os mais variados tipos de pessoas e ideologias abusivas têm que ter algum meio para justificar suas atrocidades.

Sunday, September 10, 2023

Será que estamos enlouquecendo?

Lido com gente doida desde que nasci. Meus pais nunca foram muito bem em termos de equilíbrio emocional.

Minha mãe sempre foi mestre na arte de falar até que alguém perto dela enlouqueça. E meu pai era quase uma unanimidade quando o assunto era loucura ou desequilíbrio emocional.

Lembre-me dele quebrando a casa inteira, por várias vezes, desde bem pequeno. Uma das cenas mais clássicas em minha memória, dele perdendo a cabeça, é a imagem que vi por várias vezes, de quando ele pegava um prato de comida, cheio, e o jogava no chão, espatifando-se, com pedaços de louça e arroz com feijão para todos os lados. Essa é uma imagem clássica em minhas memórias infantis.

Ele inclusive teve seu último dia como morador em casa, conosco, com os filhos e com a esposa, totalmente permeado por essa agressividade. Ele havia, no período da tarde, se desentendido com minha mãe, por telefone. Ela em casa e ele no trabalho. 

Chegou muito agressivo. Para guardar os dois carros na garagem, acelerou e freou demais, várias vezes. Parecia que ia explodir o carro na parede da sala. Entrou muito nervoso, gritando com ela e já começou a quebrar uma série de coisas em casa. E ela teve a ideia (até hoje não sei se boa ou bizarra) de colocar água para ferver. Ficou perto da panela e assim que ele se aproximou, com medo ela pegou a panela com água quente e jogou em seu rosto.

Do quarto somente percebi que alguma coisa pior já estava acontecendo, pois ele urrava muito mais intensamente. Agora, além da raiva, também tinha muita dor porque a água estava bem quente.

Eu estava no quarto porque ali procurava por meu gravador. Queria gravar o áudio daquilo tudo. Naquela época não havia possibilidade de registro quase algum, e eu queria registrar, queria que depois ele ouvisse tudo aquilo. Mas não deu tempo. Tive que correr para ajudar Edu - meu finado irmão mais velho, falecido em 1998, aos 28 anos de idade, que naquele final de 1989 tinha somente 19 para 20 anos de idade. Eu tinha 17.

Meu pai estava completamente descontrolado. Com o rosto em vermelhidão, urrava e babava de ódio. Edu fazia o que podia para tentar impedir que ele thrucidhasse minha mãe. Edu o segurava com força, mas estava todo arranhado por meu pai. Seus braços sangravam. Pegou um cano de aço e o ameaçou:

- Você fica quieto! Fica na tua! Senão eu vou quebrar esse kano na tua khara! - gritava para meu pai.

Os vizinhos apareceram e logo em seguida a polícia.

- Vem aqui me pegar se você for macho, seu bhostha! Você só tem coragem se tiver com esse revólver na mão né, seu mherda? Pode pegar o revólver! Vem pra cima de mim! Pode vir, pode vir, que eu te arrebentho. Pode mether bhala! Não tô nem aí. Vem pra você ver o que que eu faço com você! - dizia meu pai, para um dos policiais que, parado, somente o observava.

Da grande árvore, que fez parte de toda a nossa infância e parte da adolescência, havia então somente o tronco, na porta de casa. Ali estava parada a minha bicicleta. Ele a levantou no alto e a jogou contra o muro. Subiu no tronco e, mudando completamente o tom de voz, fez uma espécie de discurso político, para toda a vizinhança, para demonstrar a eles como era a vítima daquilo tudo. 

E foi assim o último dia de meu pai, quase 20 anos depois, como morador daquela casa conosco, na qual seus três filhos homens haviam crescido. Por sorte, a violência não escalou para uma tragédia, como no caso de alguns conhecidos meus. Lembro-me muito bem de um amigo, cujo pai havia tido um episódio de descontrole emocional muito parecido com esse de meu pai, mas com um desfecho trágico. Foi preso e, durante a madrugada, dentro da cela, se mathou enfhorcadho.

Talvez tenha sido sorte. Ou talvez nossas ações tenham sido suficientes para impedir uma tragédia maior. Assim como no dia em que meu pai, há exatos 20 anos, nos expulsou de sua chácara.

- Você sai daqui agora, senão eu te dou um thiru na kara! - era isso que ele dizia para meu irmão mais novo, após um episódio de ciúme.

Meu irmão mais novo sempre teve uma relação bastante amistosa com um amigo, mais velho, e que também era como um pai. Nesse dia meu pai ficou obcecado por isso ao ponto de seu ciúme escalar e resultar numa ameaça de violência nesse nível.

É muito triste a lembrança da maior parte dos episódios de loucura ou descontrole emocional, em minha família, estarem atreladas a ele. Mas infelizmente é um fato.

Mas na maior parte do tempo era uma pessoa bastante alegre, engraçada e divertida. Sabia curtir a vida e fazer uma série de coisas que são prazerosas, aventureiras e emocionantes. Não tinha medo de que as pessoas pensassem que era desequilibrado ou louco. Em muitas situações fazia o que tinha vontade e o que era mais divertido. Se vestia com simplicidade e às vezes de modo diferente e exótico. Desenhava e pintava muito bem. Pirografava. Era excelente escultor e calígrafo. Produzia réplicas perfeitas de aviões a partir de caixas velhas de maçã. Era um exímio atirador com armas de fogo, estilingues, zarabatanas, bestas e arco e flecha. 

Tinha uma coleção de bicicletas motorizadas antigas. Havia até mesmo comprado a motoquinha bizarra com a qual um urso fazia apresentações em um circo. Andava com essa motoquinha para todos os lados, sem camisa e descalço, com seu cão no colo.

Tinha um grande senso de liberdade. Fazia simplesmente o que dava vontade e costumava não se intrometer na alegria e na liberdade das pessoas.

Era protético dentário e facilitou demais a vida de inúmeras pessoas, com acesso simples, prático e altamente eficiente a próteses. Consertou minha boca em seis meses, sendo que se eu tivesse sido levado a um dentista talvez ficasse por lá durante anos para obter o mesmo resultado. Se não fosse ele, hoje eu seria teria a boca igual a do Ronaldo, jogador de futebol, quando adolescente.

Era o mecânico particular e gratuito de muitos de seus amigos. Porque, além de protético, era também um bom mecânico de motos, de mão cheia. Além de ter todas as carteirinhas de mecânica de aviões e ser um piloto privado, na raça, estudando à noite, a vida toda.

Muitos de seus e de nossos amigos diziam que ele era uma pessoa fantástica, maravilhosa, muito engraçada e divertida. Porém, que tinha somente um único problema: o álcool. Porque, quando bebia, pedia totalmente o controle e fazia muita besteira.

Talvez realmente o maior problema da vida de meu pai tenha sido o álcool. Sinceramente eu não sei. Só sei que tenho, em minha memória, uma coleção grande de histórias bizarras (muitas impublicáveis) nas quais ele é o protagonista insólito.

Por isso que digo que convivo com gente doida desde muito pequeno, e não era somente ele. Sempre fui um imã para pessoas desadaptadas e com o comportamento francamente diferente e até constrangedor, sendo eu geralmente o mais equilibrado nesse contexto. Depois que me tornei psicólogo, isso até se intensificou. Posteriormente à minha entrada na graduação de Psicologia, na USP, em 1991, eu mesmo passei, muitas vezes, a me comportar de modo mais descontrolado ou bizarro, ao ponto de algumas colegas, do 5° ano, terem me rotulado como "o louco do 4° ano". 

Ontem, depois de minha jornada de trabalho, eu saía do CAPS um pouco exausto e um pouco assustado com o aumento do número de diagnósticos de transtornos mentais, no mundo todo, no Brasil e em minha própria realidade diária, de profissional de saúde mental. Minha sensação era a de um certo esgotamento.

"Está difícil. Para onde eu olho e vou sempre encontro com alguém transtornado, adoecido mentalmente. Zeus do céu, parece que todo mundo está enlouquecendo..." - pensava, angustiado.

E eu não tenho me sentido assim somente em meu ambiente de trabalho, no CAPS. Tenho me sentido assim também no dia a dia, nas mais diversas interações sociais e familiares. Porque, como já disse, sou um imã para gente doida.

Mas não tem problema. Sou calejado. Sinto que criei um couro bem grosso para tudo isso. E eu também erro. Erro demais, e por diversas vezes também me desequilibro. Isso quase nunca ocorre em ambiente profissional. Mas, em meus relacionamentos pessoais, não sou modelo para nada. Tenho a minha individualidade, como qualquer pessoa, com o meus defeitos, qualidades e destemperanças.

E, por sorte, algumas coisas boas do louco do 4° ano ainda continuam vivas em mim.