Percebo muitas vezes os andarilhos como um mistério, que fascina pelas proezas de sobrevivência e de um nomadismo solitário, corajoso e forte. Tenho interagido com alguns pacientes que saíram andando pelo mundo. Um deles caminhou quase 100 km em um único dia, durante praticamente 20 horas seguidas. Saiu de casa às 6 horas da manhã e só parou à 1 da madrugada.
Narrava feliz sua proeza, aos 53 anos de idade, que se iniciou sem avisar nem se despedir de ninguém. Simplesmente saiu e sabendo onde queria chegar. Partiu de Abadiânia, rumo à Brasília. Tinha dinheiro para comer alguns pães de queijo. Mas nem precisou gastar esse dinheiro. Quem o viu pelas estradas se compadeceu e lhe deu de comer.
Outro, a partir dos 68 anos começou a fazer a mesma coisa, ficando da última vez, já com quase 70 anos de idade, desaparecido durante mais de 2 meses. Há a suspeita de que esteja padecendo de um processo degenerativo. Não reconhece nem mesmo seus próprios filhos. Pouco fala. E só quer saber de sair andando, aparentemente rumo a uma cidade do Nordeste, onde nasceu. Em suas andanças não pede nada para ninguém. Somente se senta em algum canto onde possam vê-lo e ajudá-lo. E assim, pelo caminho, acaba sendo alimentado e recebendo ajuda. É esse o depoimento das últimas pessoas com quem interagiu pelas ruas e estradas do Brasil.
Quem observa, logo pensa que essas pessoas têm uma estrutura corporal forte. Mas também me pergunto sobre o passado evolutivo de nossa espécie, nômade, que caminhava em média 20 km por dia, e no quanto esse comportamento errante, em eterno movimento de caminhar, talvez tenha alguma relação com algum tipo de fortalecimento corporal.
De vez em quando dá vontade de sair por aí, caminhando sem rumo e ficar onde parar.
ReplyDeleteMas como não é tão simples assim, a gente fica preso na nossa vida pensando que é livre.