Thursday, October 29, 2015

Pai conta como deixou seu filho, bebê, morrer...

No dia 26 de abril de 1989, Rodolfo e Tamara Linares visitaram seu bebê (de 1 ano e 3 meses de idade), em coma, no hospital, pela última vez.

Rodolfo Linares esperou sua esposa deixar o quarto do hospital, se virou para a única enfermeira que havia no recinto, e perguntou-lhe quanto tempo levaria para que seu bebê parasse de respirar se fosse retirado o respirador.

"Cerca de 15 minutos. Por que a pergunta?"

Linares sacou de seu casaco um revólver Magnum 357, e anunciou: “Esta é uma arma real. É isso. Basta!”

Ele então beijou seu filho, Samuel, disse que o amava, e retirou de sua boca o tubo respirador que o mantinha vivo durante os últimos 8 meses, desde que se engasgara com uma bexiga. Chorando, embalou seu bebê em seus braços por 40 minutos até que a criança morresse. Chorou durante 40 minutos, ninando seu filho nos braços, dizendo que o amava e para que Deus o perdoasse.

E você continua batendo o pé contra a eutanásia, contra o direito de morrer...

Thursday, October 22, 2015

FAQ: aborto e direito à vida

Meu último vídeo tem o seguinte título:

“O direito de viver, matar e morrer no pensamento de Peter Singer”

Eis o link para o mesmo:


E hoje resolvi debater um pouco com um interlocutor (o qual chamarei de Jair) que faz perguntas bastantes comuns, que muitas pessoas fazem, as quais merecem talvez algumas respostas mais diretas. Transcrevo abaixo, então, esse pequeno debate:

Jair (em comentário ao vídeo): Falácia do apelo a autoridade kkkkk

Adriano: Por quê?

Jair: vc quer passar um escritor como verdade absoluta, a questão do aborto é tão simples de resolver. Pergunte para as crianças abandonadas se elas preferiam não ter nascido, ensine as mulheres a usar métodos ANTICONCEPCIONAIS. Apelar para o assassinato de seres inocente é ridículo.

Adriano: Primeiramente, esse vídeo nem trata da questão do aborto. Porém, acho que vale pena responder, mesmo assim.

Penso que seria uma falácia de apelo à autoridade se eu simplesmente afirmasse que o aborto deve ser legalizado porque segundo Peter Singer isso é correto e ponto final. Se eu não tivesse construído nenhum tipo de argumento, se eu não tivesse feito nenhum tipo de justificativa e somente tentasse levar o leitor acreditar que isso ou aquilo é certo ou errado porque alguma autoridade disse, isso sim seria apelo à autoridade. E não foi isso o que ocorreu.

Eu simplesmente faço a citação de Peter Singer porque não posso sair por aí esbanjando argumentos dos outros como se fossem meus. Somente estou citando a fonte. Isso é uma obrigação moral também. Sair por aí esbanjando uma série de ideias que não são minhas, como se fossem minhas, é plágio. Isso não somente é antiético como é crime. Me perdoe, mas eu acho que você está confundindo a obrigação moral e ética de citar fontes com apelos à autoridade.

Jair: é uma questão de matar ou não um ser humano, por mais que vc negue que um feto é um ser humano os fatos dizem o contrário. E outra, com a legalização do aborto há um perigo real de aumentar os casos de DSTs. É um absurdo legalizar assassinato e burrice no que diz respeito a controle de DSTs.

Adriano: Você disse que eu nego que o feto é um ser humano. Isso também não é verdade. Em nenhum momento eu afirmei isso. Se a legalização do aborto é um perigo real para aumentar os casos de DSTs, me explique por quê, e por favor cite as pesquisas científicas que embasam o que você está afirmando. Por que é um perigo real? Qual é o estudo experimental ou quais são as evidências epidemiológicas que sustentam essa sua afirmação? Ou isso é somente uma suposição da sua parte?

Você sugeriu que eu perguntasse para as crianças abandonadas se elas prefeririam não ter nascido. Isso me lembra muito a seguinte pergunta, a qual costumam muito frequentemente fazer aos defensores da legalização do aborto: "E se você tivesse sido abortado?". E a resposta é muito simples: se eu tivesse sido abortado, eu não estaria aqui para lamentar ou reclamar do que quer que seja.

Perguntar para uma pessoa se ela preferiria ou não ter nascido não necessariamente implicará em uma única resposta. A minha impressão é que você pressupõe que qualquer pessoa irá sempre responder do mesmo modo, que qualquer pessoa irá responder que preferia ter nascido, apesar de todas as adversidades que enfrenta em sua vida.

Mas essa sua pergunta talvez seja muito importante para nos reportarmos novamente ao pensamento de Peter Singer. Quem deveria responder a essa pergunta seria o próprio feto. E se ele não é capaz de responder a essa pergunta, quem deve respondê-la é quem tem esse feto sob sua responsabilidade, ou seja: sua mãe.

A ética proposta por Peter Singer jamais propõe que devemos matar seres humanos autônomos e com consciencia de si mesmos (ou mesmo aqueles que já foram assim algum dia), donos de sua própria vida e de seu próprio corpo. Expliquei isso muito bem explicado no vídeo, e acho que você não compreendeu.

O feto, o cérebro e a pessoa humana

Segundo Michael Gazzaniga, você não caminha por uma loja de materiais de construção e visualiza 30 casas. Você vê materiais que precisam de arquitetos, carpinteiros, eletricistas, encanadores para poder se criar uma casa.

Um embrião fertilizado pode então ser considerado, em termos genéticos, como um membro da espécie humana, mas há uma diferença muitíssimo grande de um embrião para um ser humano com todos os seus sistemas formados, principalmente o sistema nervoso, o qual lhe confere a capacidade para perceber o mundo e sofrer.

Esse embrião necessita de um útero e pelo menos 12 semanas de gestação, com o desenvolvimento, o crescimento, a duplicação celular, a formação de neurônios (de um sistema neurológico completo), além do zelo e autocuidado empenhado da mãe, diversas consultas médicas para o pré-natal, dedicação, paciência, alimentação e hábitos cuidadosos, para se tornar um ser humano biologicamente completo e objeto de nossas preocupações morais, já que depois de todo esse processo é um ser que sofre, assim como sofre quem cuidou para que chegasse até nesse ponto, e geralmente deseja , e muito, que continue vivendo.

Quando uma loja de materiais de construção sofre um incêndio, a manchete do jornal não é: "30 casas pegam fogo”. É: "Loja de materiais de construção pega fogo”.

O direito de viver, matar e morrer no pensamento de Peter Singer

Peter Singer, referência fundamental em bioética, é um autor que traça reflexões importantes sobre o direito à vida, o direito de morrer e o direito de matar.
O primeiro ponto que deve ser levado em conta é que ele é um utilitarista. Na concepção utilitarista é um imperativo ético agir para diminuir o sofrimento no mundo como um todo. Neste sentido, a ética não se restringe às interações entre os seres humanos. Se estende também para as interações dos seres humanos com todos os outros seres vivos.

A ética é uma filosofia da ação, a qual faz reflexões sistemáticas sobre os conceitos de bem e mal, tentando produzir conhecimentos consistentes sobre nossas ações em relação aos seus possíveis benefícios e e malefícios para todos os seres vivos que sofrem.

O objetivo da ética utilitarista é a diminuição de sofrimentos evitáveis no mundo porque, para esta abordagem, o sofrimento evitável é de certo modo o próprio mal. Se há sofrimento e ele é evitável, eis o mal a ser combatido.

O utilitarismo adotado por Peter Singer, por sua vez, se atrela bastante ao respeito pelos interesses dos seres vivos em questão. A compreensão é a de que, tendo seus interesses vitais contrariados, alguns seres vivos sofrem bastante. Ou seja, somente possuem interesses os seres vivos que sofrem. Em tese, as plantas ou um feto com menos de doze semanas de vida, por exemplo, não possuem interesse algum, já que até o presente momento não possuímos qualquer tipo de evidência de que sofrem.

Então, que fique claro, para esta concepção ética não há uma sacralização da vida, nem mesmo da vida humana. Aliás, em termos modernos, não faz sentido se sacralizar o que quer que seja. Nesse sentido, o respeito maior é pelo interesse de cada um em relação a si mesmo: ao seu próprio corpo e à sua própria vida. É ético, nesse caso, fundamentalmente, o respeito pelo outro e por seu bem-estar, desde que esse bem-estar não cause diretamente malefícios a terceiros.

Nesses termos, portanto, o direito à vida deve ser concedido àqueles seres que sofrem e que tem interesse em continuar vivendo, os quais têm consciência de que estão vivendo e de que existe a morte, sendo capazes de conceber um tempo futuro e de planejar sua própria vida em relação a esses dados de sua realidade.

Para os seres humanos, por exemplo, é importante saber que têm o direito à vida, que outras pessoas não podem simplesmente atentar contra a sua vida (ou contra a vida das pessoas que estimam) sem que isso tenha consequências sérias. Saber que o estado ou outras pessoas poderiam dar cabo de nossas vidas (ou da vida das pessoas que amamos), arbitrariamente, pode causar muita angústia e sofrimento em todas as pessoas, com sérios riscos de ruptura do tecido social. Isso é a barbárie, a guerra de todos contra todos.

Não há garantia de uma organização social mínima sem que o direito à vida seja resguardado. Não teríamos nesse caso uma sociedade mas sim grupos, clãs, isolados e em constante tensão.

Portanto, o direito à vida serve para proteger a vida dos indivíduos e da sociedade como um todo. Mesmo os mais niilistas e desapegados em relação à sua própria vida, tem de certo modo a obrigação moral de lutarem, na medida do possível, para se manterem vivos e bem, já que a vida de um ser humano costuma geralmente ser muito preciosa a outros seres humanos. Quando uma pessoa morre, geralmente outras ficam vivas e sofrendo muito em virtude dessa que se foi. Algumas pessoas, quando morrem, podem deixar danos irreparáveis nos que ficam.

Contudo, se uma pessoa está sobrevivendo em péssimas condições, em sofrimento extremo e irremediável (o qual é vivenciado por essa pessoa como insuportável), deve haver condições sociais para que ela tenha o direito de morrer. Se não somos, como sociedade, capazes de aliviar o sofrimento extremo de alguém que não suporta mais viver, devemos ajudá-la a morrer com dignidade.

Nesta vertente prevalece uma concepção consequencialista. Se a consequência do que fazemos produz mais benefícios do que malefícios, essa ação é geralmente julgada como a correta, como aquela que deve ser adotada. Então o direito de morrer, o direito à eutanásia, o direito a uma morte indolor, para quem possui uma doença terminal ou padece de sofrimentos extremos e irremediáveis, é o direito de terminar com sofrimentos que podem e devem ser evitados. Isso é uma ética da compaixão, da empatia e do respeito pela autonomia das pessoas.

E, por fim, o direito de matar. Não há como sustentar a afirmação simplória de que matar é sempre errado, porque nossa sobrevivência enquanto espécie implica em matar seres de outras espécies, o tempo todo. Mesmo quem adota uma dieta vegetariana também mata outros seres vivos para poder se alimentar deles, ou para se proteger e não contrair doenças e vir a perecer. No final das contas, o mais importante é saber como os seres vivos sencientes (que sofrem), que estão sob nossa responsabilidade, estão vivendo e sendo criados por nós. E se formos nos alimentar deles, é eticamente importante que tenham um abate o mais indolor possível, pois temos condições de lhes garantir uma morte digna. Assim como temos condições de diminuir, em nossa população, a ingestão de proteína animal, a qual pode ser, em boa medida (mas não totalmente), substituída por proteína de origem vegetal.

Finalizando: a ética proposta por Peter Singer jamais propõe que deve-se matar esse ou aquele ser vivo. Não é prescritiva nesse sentido. Matar não é um dever, muito menos nos contextos que envolvem seres humanos. É, no máximo, um direito. O dever, nesta concepção, está relacionado à diminuição do sofrimento no mundo, o qual de forma alguma se resolve com prescrições de extinção de seres humanos, em massa, como muitos afirmam para tentar refutar a ética utilitarista. Portanto, conforme as razões que já foram aqui expostas, seres humanos autônomos e com consciência de si mesmos (ou mesmo aqueles que já foram assim algum dia), donos de sua própria vida e de seu próprio corpo,  esses seres humanos têm direito à vida.